Consultoria Empresarial
Talvez seja pela capacidade de sedução de atividades como literatura, cinema, teatro, arquitetura, gastronomia, design, moda, games e publicidade que muitos não se dão conta de que essas atividades que têm talento, conhecimento e imaginação como origem são importantes geradoras de riqueza. John Howkins percebeu isso e, em 2001, publicou o best-seller Economia Criativa – Como Ganhar Dinheiro Com Ideias Criativas, em que explica as bases da combinação de criatividade e empreendedorismo.
Hoje, aos 71 anos, esse inglês que já foi executivo da Unilever, Time Warner e HBO, é consultor, palestrante e professor visitante de universidades ao redor do mundo. No Brasil, é o mentor criativo da faculdade Belas Artes desde 2015, onde realiza reuniões semestrais com os coordenadores, avalia a grade curricular e orienta os projetos da incubadora. Essa intimidade com os brasileiros criativos faz com que Howkins tenha uma perspectiva privilegiada sobre o potencial de crescimento para a Economia Criativa por aqui.
Como você avalia o desenvolvimento do Brasil em Economia Criativa?
O Brasil é famoso em todo mundo por seu senso de estilo e design, pelo uso de cores, pelos ritmos e pela inventividade. É um dos poucos países em que o espírito criativo nato floresce de forma tão maravilhosa. Seu desafio agora é transformar esse recurso natural no coração da sua economia. Hoje as indústrias criativas empregam cerca de 11 milhões de brasileiros, de um total de 210 milhões. São números significativos, mas podem crescer. O Brasil é excepcionalmente talentoso em moda, música, design, arquitetura, produção de audiovisual (cinema, TV e vídeo) e mídia digital.
Quais são os erros mais comuns dos empreendedores criativos?
De certa forma, toda pessoa criativa é um empreendedor das suas próprias ideias. E a marca de um empreendedor é sua crença inabalável em sua própria ideia e sua capacidade de equilibrar essa crença com o que o mercado quer. Então, os dois erros mais comuns são ter preguiça de defender suas próprias ideias e ignorar o que o mercado deseja.
O que você tem a dizer sobre o universo das startups?
As startups são uma boa forma de começar e controlar algo novo. Mas elas não são a única fonte de novas ideias – lembre-se que Amazon, Google e Tencent produzem um fluxo inesgotável de novas ideias – por outro lado, abrir uma empresa é a única maneira para que uma pessoa possa reter o controle sobre as suas próprias ideias e colocá-las no mercado. Universidades como a Belas Artes estão tomando a iniciativa em equipar seus alunos com habilidades de gestão básicas. O governo pode fazer sua parte ajudando as pessoas a gerir suas próprias empresas – por exemplo, reduzindo os entraves burocráticos – e, com isso, apoiar seu crescimento.
O que você acha que o Brasil precisa fazer para atingir o seu potencial pleno?
O desafio do Brasil tem quatro etapas: primeiro, ajudar as pessoas a desenvolver suas ideias; dois: ajudá-los a abrir suas próprias empresas; três: ajudar as empresas pequenas a se tornarem empresas maiores; e, quatro, tornar essas empresas competitivas e bem-sucedidas não só no Brasil, mas também em mercados de exportação. Isso exige um esforço conjunto da indústria, bancos, sindicatos e outras organizações de trabalhadores, universidades e governo para identificar os obstáculos e providenciar as soluções. Eu sei que esse assunto tem sido bastante discutido nos últimos anos, mas o acompanhamento tem deixado a desejar. Os principais obstáculos parecem ser gestão, finanças e regulamentação. De fato, alguns problemas são conhecidos há anos, como, por exemplo, a falta de linhas de financiamento, mas pouco foi conquistado. Talvez exista uma falha em enxergar a ligação entre criatividade e inovação. Talvez falte ambição ou determinação. A notícia boa é que o Brasil tem várias histórias de sucesso e que podem ser vistas como exemplos. Mas vocês não estão sozinhos, todos os países estão enfrentando os mesmos desafios. Então, é que uma questão de olhar as experiências dos outros, tanto as bem-sucedidas quanto as que fracassaram, para criar sua própria estratégia.
O que você prevê para o setor criativo nos próximos anos?
No Brasil, a Economia Criativa cresceu mais rápido do que o resto da economia no período entre 2010-15. Nos Estados Unidos, China e na maior parte da Europa, tem crescido três ou quatro vezes mais rápido que a média da economia. Minha expectativa é que essas taxas de crescimento aumentem. O crescimento será mais rápido em países onde a Economia Criativa é forte e saudável. Criatividade é uma ferramenta de sobrevivência. Conforme nos movemos em direção a um mundo automatizado, onde Inteligência Artificial, algoritmos e robôs substituem os empregos de várias categorias de trabalhadores, a criatividade ganha ainda mais destaque. Por isso, o país que não estabelecer uma economia criativa vibrante e fortalecida em um prazo de cinco a dez anos, vai enfrentar problemas consideráveis.
O que você diz aos céticos?
Digo que a Economia Criativa é a parte mais forte e de crescimento mais rápido de todas as economias ao redor do mundo, dos Estados Unidos à China. Seus profissionais têm, em média, melhor formação educacional e têm salários mais altos. A economia criativa é a preferência dos jovens na escolha profissional. É a melhor forma de manter as heranças e a culturas nacionais seja por si mesmas ou para promover o turismo. Contribui com o bem-estar social. Eu não tenho dúvida que um país que ignora seus talentos criativos vai perder o controle sobre o seu destino. Não é possível para um país simplesmente dizer “não” para a Economia Criativa, tanto quanto não é possível desistir de manufatura, tecnologia ou da internet. Vivemos em um mundo integrado e competitivo e um país que parece não se mover na verdade está andando para trás.
Em que medida você acha que a onda de conservadorismo pode atingir a Economia Criativa?
O voto pelo Brexit, a eleição de Trump e a situação política na Itália e na França são votos pelo nacionalismo e pelo protencionismo. Criatividade, em contraste, depende do livre intercâmbio de ideias por pessoal que são fisicamente livres para se moverem ao redor do planeta. Essas são certamente ameaças de curto prazo, mas ainda é muito cedo para saber quais serão os efeitos a longo prazo.
Fonte: Época Negócios.